terça-feira, 24 de maio de 2011

Espiritualidade e Inclusão Social


Após a abertura do Curso Oficina INCLUSÃO SOCIAL: Autenticidade da Espiritualidade Cristã, com a belíssima apresentação do Coral do Centro de Apoio Pedagógico ao Deficiente Visual da Secretaria de Educação, que emocionou e comoveu a todos os presentes, no dia 13 de maio, Pe. Carlos Rafael Cabarrús, SJ iniciou os trabalhos, afirmando que a inclusão dos excluídos dá autenticidade à espiritualidade cristã, porque é uma espiritualidade que está próxima da maneira, do jeito de Jesus. E destacou: Jesus foi tremendamente humano e corporal, não tinha medo de tocar, estava o tempo inteiro buscando incluir, falava com as mulheres, tinha uma vida em itinerância; seu comportamento e sua pregação são uma coisa única: volta-se para o Reino - que começa aqui e termina no seio do Pai - e para o povo mais simples.

Prosseguiu, ressaltando que, para trabalhar com os excluídos é muito importante explorar a Água Viva que está no coração de cada pessoa e, assim, formar a consciência de valores humanos e cristãos. Também é necessário conhecer a raiz dos problemas, através da análise da realidade, onde sejam trabalhados alguns aspectos: o sujeito, a capacidade de honestidade e a capacidade de integração, levando em consideração sete dimensões básicas:
- a primeira é a subjetividade, isto é, trabalhar primeiro o sujeito para depois trabalhar o mundo, porque, se ainda não sarei minhas feridas, automaticamente eu atuo ferindo, a tendência é atuar mal. E questionou: como ser líder sem trabalhar este aspecto?
- a segunda dimensão a considerar é que tudo, neste mundo, é uma estrutura, então, a análise da sociedade é análise de uma estrutura. Tudo tem um mecanismo, é preciso captar este ordenamento específico, o ponto específico que norteia os demais aspectos; portanto, mexer nas instituições políticas e sociais é mexer em estruturas.
- a terceira dimensão é a ideologia; nós acreditamos que as ideologias são dos outros, mas as religiões também têm ideologias; as religiões têm ideologias, mas a Fé, não. A ideologia é como lentes de contato, que dão uma visão diferente, distorcem a realidade. Tenho que saber qual é a minha ideologia e a dos outros também. Mais uma vez, propôs um questionamento: Eu tenho ideologia? O que eu quero? Quero mudar ou manter o status quo? Se você se expõe a situações diferentes, pode derrubar as ideologias. Exemplo: se eu não conheço o que é uma favela, tenho uma ideologia sobre ela, que me é colocada pela mídia. Só estando no lugar, com as pessoas, eu posso compreendê-las. Por trás das ideologias estão os paradigmas, dentre eles podemos citar: o machismo, o patriarcalismo, o racismo, o consumismo, o relativismo.

- a quarta dimensão: o papel do feminino, que é muito importante, porque as mulheres são 60% da população mundial e, por causa do machismo, este papel fica muito reprimido. É preciso levar em conta, na análise e na ação transformadora que, quando as mulheres se juntam, têm uma perspectiva e uma análise diferente. Trata-se do papel que têm e que poderiam ter, o que podem fazer, o tanto que poderiam facilitar.
- a quinta dimensão é a questão ecológica, a preocupação com o meio ambiente, porque os elementos da natureza estão sendo agredidos, devastados. Isso pode nos unir e promover o despertar das consciências. Tem muita relação com o feminino, que tem a ver com o cuidar da vida, gerar vida. É preciso encontrar as raízes das problemáticas e buscar as transformações possíveis.
- a sexta dimensão é o aspecto religioso, lembrando o papel das seitas fundamentalistas, que se infiltraram para minar o “subversivo” do catolicismo. Analisar qual é o papel das religiões, porque a fé é uma força muito grande para manter o status quo ou para promover a ação transformadora. Observar o paradigma de que Deus é homem, varão, mas quando Jesus falava da Ruah estava falando da Espírito, no feminino, e nós usamos o masculino e colocamos adjetivos femininos para Deus. As religiões têm o poder de manter o estabelecido e de promover a transformação.
- a sétima dimensão é a ação transformadora: o ver e o agir. Indagar: o que transforma e o que mantém esta “desordem” estabelecida? Com esta ação, o que se transforma? O que faço ajuda ao processo de transformação? As ações têm que ser transformadoras, por isso temos que planejar atividades que sejam transformadoras. Pensar em como transformar esta “desordem”, não só em nível nacional, mas, também em nível mundial. Tudo tem a ver com a formação de pessoas com grande consciência civil, formação de lideranças.
E destacou a importância de ter como plataforma de trabalho a construção de tecidos sociais, micro tecidos, redes simétricas ou assimétricas, que podem ser presenciais ou mesmo pela internet, lembrando que Jesus era itinerante, mas estava conectado com os que tinham mais condições para partilhar. O tecido social é uma grande força e lá tem o papel das lideranças e como formá-las. Há necessidade de perceber o sujeito como pessoa humana e trabalhar na construção e reconstrução do tecido social, através de elementos horizontais e verticais que partem dos sem poder.
Lançou-nos uma indagação: Como orientar nosso trabalho para empoderar estas pessoas e construir o tecido social? E, como pista, sugeriu voltar a atenção para os elementos que compõem o tecido social:
horizontais:
1) aproveitar as necessidades básicas: é o arranque de um possível tecido social, por isso importa captar as necessidades “concretas”.
2) ter mais ou menos a mesma maneira de pensar = ideologia básica comum, não as grandes ideologias, mas o que nos permite estar juntos
3) Para começar a trabalhar é preciso respeitar as normas, porque, se não tiver normas, vai ser um tecido de impunidade; por isso estabelecer normas de convivência pacífica
4) tudo isso requer uma organização e a emergência de um coletivo de líderes
5) passar das necessidades emergentes para os interesses a longo prazo.
verticais:
1) A comunicação é fundamental, mas comunicação oficial e institucionalizada, para que todos tenham conhecimento dos fatos e evitar divisões
2) Planejar, Aprender a elaborar projetos que correspondam aos interesses comuns: econômicos, sociais, religiosos, políticos...
3) O resultado de todo esse processo será uma grande Identidade, constituída pelos projetos, pelas normas.
Estes elementos não são rígidos, uns são mais fortes que outros, mas é importante identificar as necessidades e interconectá-las, porque são estruturais, requerem uma organização e uma formação. É fundamental tomar consciência da força que têm os tecidos e interligá-los, fazer um amálgama logístico sem o maniqueísmo do bom e mau, fazer alianças, mesmo que sejam do momento, mas que, como a palmeira, deem sustentação. Não ser rígido como um edifício de concreto, mas flexível como a palmeira, que não quebra, mas numa atitude sábia, se dobra à força do vento e das tempestades procurando manter sua sustentação. O tecido precisa ter uma base econômica que possibilite uma vida melhor.

Enfatizou, também, que, para fortalecer a luta dos sem poder, a formação de lideranças é a chave e destacou o seguinte critério: a vocação primária do(a) verdadeiro(a) líder está no modo como a pessoa atrai os outros. É aquele que convoca, atrai pessoas que esperam algo como que uma orientação deste, incentiva, inspira, anima, aglutina pessoas, integra as vozes dos demais. Precisa ter qualidades de liderança, ser flexível, ter características de pigmaleão, e não ter qualidades de caudilho, ditador. Aquele que manda e impõe não é líder. A primeira condição para a formação de lideranças é que haja um sujeito líder. Prestar atenção nas vocações para liderança. Às vezes, tem que fazer um trabalho pessoal para curar as feridas e drenar os venenos que têm três raízes: muita raiva, muita dor, a culpa malsã/doentia (culpa não curada)- para não sair ferindo quem nos rodeia - e trabalhar a parte positiva, porque, se o líder está mal, leva à perdição.

Para que verdadeiros líderes sejam formados é preciso purificar os corações e organizar os valores. Antigamente, a família era o referencial dos valores, hoje não existem ‘os ninhos’ para que os valores se formem. O traço mais importante: só é valor se eu estiver disponível a ARRISCAR ou se eu estiver disponível a RENUNCIAR ALGO por esta CAUSA, pois o valor não é um troféu, mas algo que nos ajuda a atuar na sociedade. Dentre os valores que o líder deve ter estão: a dignidade da pessoa humana e da terra, a tolerância, a justiça e a solidariedade. Todos funcionam como “VALORES MÃE”.

Ainda ressaltou alguns traços da formação de lideranças:
1) Formar no diálogo, porque isso é básico para experimentar e construir a empatia; isso não é impor, falar mais forte, mas colocar-se no lugar do outro, porque o ponto de vista precisa deslocar-se, movimentar-se, ir lá onde está o problema. O diálogo não é só falar, mas falar e escutar, experimentar o que falam, colocar-me onde o outro está e convidá-lo para vir onde estou e, assim, construir a nossa verdade.
2) Formar na força da não violência.

Para concluir esta breve síntese, retomamos um trecho da fala de Pe. Cabarrús no primeiro dia: Se tratamos de espiritualidade cristã, temos de voltar às fontes: viver com os excluídos, gerando grupos (apóstolos, discípulos), formando pequenas manadas. Jesus se preocupou em formar pequenas comunidades; hoje, diríamos redes, redes sociais. Nelas, a palavra básica é partilhar: os que não tinham se beneficiavam da partilha dos outros. Formar redes para provocar quem tem mais partilhar.

Um comentário:

  1. Parabéns a equipe do CIES pela realização do Curso-Oficina de Pe. Cabarrús,sj.

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