terça-feira, 27 de maio de 2014

Da Maria Histórica à Maria da Fé

A Ir. Lina Boff iniciou o Curso de Mariologia afirmando que a sua Teologia, na perspectiva mariológica, reflete sua forte experiência missionária com os seringueiros do Acre na década de 60, com os menores infratores da FEBEM no Rio de Janeiro, expandiu-se para a África, Correia do Sul, Filipinas e aprofundou-se na Academia, por isso fala, não só o que sabe e estudou, mas, sobretudo, aquilo que vivenciou. Então, pode nos ajudar a “sair da devoção e chegar às origens, para conhecer os fundamentos, visando aprofundar e degustar, de forma espiritual, para levar ao mundo o que recebermos aqui”.
 Recordou-nos “Como tudo começou com Maria de Nazaré”, pois vemos, nos Evangelhos, que Maria não era conhecida como hoje a cultuamos: a Nossa Mãe, Nossa Senhora da Vida, da Encarnação, da Humanidade, era vista e tratada como todas as mulheres judias de seu tempo. Assim, em Gl 4,4, quando Paulo afirma que Deus enviou o seu Filho nascido de uma mulher..., ressalta: 1) o mistério da Encarnação do Filho de Deus, Segunda Pessoa da Trindade, que nasce fora da estrutura da Aliança, porque nasce de uma mulher; 2) o mistério da mulher que gera homens e mulheres para Deus, pois existe a maternidade biológica, a espiritual e a intelectual.


Afirmou Ir. Lina que a primeira revelação de comunidade se dá em Maria, primeira mulher a receber o Espírito Santo, que é o amor que o Pai tem pelo Filho, por isso, toda a Comunidade Trinitária está contida no útero de Maria. E prosseguiu: “A Teologia precisa ser inclusiva, tirar Maria do andor e trazê-la para caminhar conosco, colocá-la no meio de nós”. Também refletiu que “não é verdade que o Evangelho fala pouco em Maria, fala o suficiente, nós é que ainda não percebemos as consequências”. Sugeriu que façamos uma leitura pormenorizada do oitavo capítulo da Lumen Gentium, a fim de compreender que “Maria está no último capítulo como coroamento da caminhada da Igreja, porque foi a única mãe que se tornou discípula do próprio Filho. Maria é Mãe e membro da Igreja porque participa, como Mãe de Cristo, que é Cabeça e fundador da Igreja. Cristo é o único mediador e Maria participa da mediação de Cristo, não é uma deusa, ela participa daquilo que o Filho é, por isso não a colocamos no sacrário”


Em sua reflexão, Ir. Lina diz que “o Filho ultrapassou Maria pela sabedoria e Maria ultrapassou Jesus pela fé. A crise que o Filho teve no Getsêmani, a mãe experimentou primeiro, e sua conversão terminou ao pés da Cruz. Maria passou por um processo gradativo até compreender que o Filho não era seu, mas de Deus”. Ressaltou que Mateus coloca José como protagonista e, junto com Lucas, fazem a teologia da ternura. Mateus se preocupa com a comunidade, então, traz a genealogia, a origem biológica de Jesus, a descendência de Davi. Lucas é o único que dá a palavra a Maria quatro vezes, apresenta uma Maria ativa, esclarecida, que quer saber das coisas: na Anunciação, Como isso vai acontecer e Eis aqui a serva do Senhor; canta no Magnificat e, ao encontrar Jesus no templo: Filho, por que fizeste isso convosco?
 
          Sobre o Magnificat, lembrou-nos que entrou nas CEBs como um cântico revolucionário, na época do Vaticano II polarizado, porém sinaliza o momento em que Maria sente confirmada a sua gravidez e irrompe num Canto que tem um núcleo terno (aquilo que Deus está escutando como clamor do seu povo) e um núcleo duro (aquilo que está acontecendo), para expressar “a indignação de Maria ao ver o sofrimento de seu povo; Maria abre sua alma ao Senhor e deixa seu Espírito fazer a experiência mística, porque a alma é o que dá identidade, traz os sentimentos, as emoções, os registros da genealogia; o Espírito, é a força mística que provoca a explosão do que tem dentro”. Alertou-nos que devemos dar visibilidade àquilo que somos, porque foi Deus quem nos deu a força e podemos aplicar este Canto às nossas mães e às nossas filhas casadas, atentando para os sinais de Deus e a presença d’Ele nas pessoas.

Ainda em Lucas, foi destacada a presença de Maria na Igreja que estava sendo gestada, registrando que as mulheres estavam lá para receber o Paráclito, então, os ensinamentos de Jesus incluem as mulheres, embora no momento do “envio” só haja homens. Isso prova que o discipulado feminino é antigo, porque não era só Maria que estava lá, mas também suas primas e amigas que seguiam, serviam e ouviam Jesus. E deixou os questionamentos: por que as mulheres não aparecem na pregação se receberam o Paráclito? Onde foram parar as mulheres?
No Evangelho de João 2, 1-10, encontramos a festa de casamento, na qual Maria foi atendida porque se dirigiu aos “serventes”, que sabiam o conteúdo das talhas; ali, Jesus é o “vinho novo” e temos o “mandamento de Maria: Fazei tudo o ele vos disser. “Como Maria está ao pé da Cruz” é o coroamento da caminhada de Maria, porque ali ela entende o que Jesus lhe disse no templo; temos a herança e o testamento de Jesus: “a humanidade é acolhida na generosidade de Maria, que está firme, de pé, ensinando-nos que não se deve interrogar a Deus nos momentos de dor e provação, apenas viver e, depois, virá o entendimento, porque os caminhos d’Ele são diferentes dos nossos. Nunca projetar de forma fechada, deixar espaço para Deus agir, porque Ele intervém. Jesus nos deixou a sua Mãe como herança. Maria é Mãe do Filho de Deus e mãe do homem Jesus que é Filho de Deus”. (Marize Pitta)
 

Um comentário:

  1. Marize: parabens pelo seu comentário e seu poder de síntese, que muito admiro.Bjs Conceição

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